domingo, 30 de agosto de 2015

É blush


Milena deixou escapar pra Luciana, de um jeito que eu não lembro agora, que acha um colega da escola bonitinho. Falou e deixou escapar aquele sorrisinho que entrega tudo.
LU: Fulano é teu namorado?

MILA (tímida): não... Ele é meu amigo.
LU: hummm, você está com as bochechas vermelhas...
MILA: é blush.

Era blush mesmo. Blush misturado ao rubor da vergoinha. Ela não ligou uma coisa à outra e eu achei graça da ingenuidade dela.

sábado, 29 de agosto de 2015

Resposta automática


Sou péssima em dar respostas automáticas. Agora, por exemplo, fui ajudar uma senhora no ônibus, aí ela deu a entender que iria me agradecer de alguma forma. E assim fez. Disse: "Deus te abençoe, minha filha". Ao invés de retribuir o carinho e desejar que Deus a abençoasse também, eu mandei um caloroso "de nada", totalmente fora do contexto. Tava preparada só pro "obrigada". 
Poderia ter sido pior. Costumo dizer "magina!" pra tudo. Imagina o impacto negativo que um "magina!" causaria num sincero "Deus te abençoe"?

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Três segundos


Almocei no Village Mall, mas antes de voltar ao escritório, passei no McDonald’s para comprar um sundae. Comprei e fui caminhando, sem pressa, rumo à saída. Quando eu estava prestes a cruzar a fronteira entre o shopping e a rua, vi a porta automática da entrada se fechando. Eu não estava perto o suficiente para passar por ela, mas como curto me dar minidesafios e gosto de testar os poderes que juro ter sobre as máquinas, dei uma acelerada no passo.
Não consigo ver uma porta automática se fechando sem impedir que isso aconteça sem a minha passagem. Então lá fui eu, cheia de autoridade, caminhando até ela como se dissesse “ei, bonitona, onde você pensa que vai com tanta pressa?”. Eu não estava na direção da porta, então tive que ir, meio na diagonal, para atingir o meu objetivo bocó. Exageros à parte, era quase uma questão de honra passar por ela antes que se fechasse por completo. Sim, eu me prestei a isso. Sim, sou uma criança de 8 anos aprisionada no corpo de uma mulher de 34.
Mas fui traída. Estiquei o braço para que o sensor entendesse que tinha alguém ali, mas a porta ignorou o meu recado e fechou em cima de mim. Nem quis saber. Corpo dentro do shopping, mão esquerda e sundae do lado de fora. Nada mais patético, nada mais ridículo.
A porta levou uns 3 segundos para entender que tinha um obstáculo e, vingativa, me torturou. Foram 3 intermináveis segundos, o suficiente para que eu tivesse um minipânico, arregalasse os olhos, suasse frio, tivesse uma taquicardia, o ar me faltasse, essas coisas todas. Mentira, claro, mas rolou uma tensãozinha escrota, sim. Agora uma coisa é verdade. Nessas horas, acho que o cérebro não oxigena direito e eu perco a capacidade de distinguir o simples do complexo. Naqueles 3 segundos de insanidade, por exemplo, a ideia louca que passou pela minha cabeça de que eu poderia ficar presa para sempre fez a razão dar lugar ao desespero. É em situações assim que penso nas coisas mais extremas e mais absurdas, como ter de cortar a porta de vidro para eu sair. Sempre penso numa solução radical para um problema relativamente bobo.
O segurança viu aquela cena ridícula, viu o meu desespero e, óbvio, riu. Ele tentou disfarçar, mas eu bem vi. Ri junto para deixá-lo à vontade, então ele se permitiu rir mais descaradamente. Eu, meu braço esquerdo e o sundae fomos salvos sem arranhões. Traumatizada, prometi para mim mesma nunca mais desafiar uma porta automática na minha vida.
Não dizem por aí que as máquinas vão dominar o mundo? Se isso está perto de acontecer, eu não sei, mas que elas já começaram a fazer um silencioso e violento protesto, eu não tenho dúvida. Taí a sacana porta do Village Mall que não me deixa mentir.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

A hora da escolha



Quero fazer um apelo à TriFil e às demais fabricantes de meias-calças: por favor, deem nomes mais fáceis de interpretar aos seus produtos, queridos. Já não basta o drama de eu ter de levar a meia extra-grande e aceitar que tô ali, na última fronteira, gente? Suplico isso por que eu nunca sei que tom devo levar. Nunca sei qual está de acordo com o meu tom de pele. É mate, é castor, é mel, é tabaco, é natural e é bem possível que eu tenha testado todas essas e outras centenas, porém, sem sucesso. Eu até faço aquele teste da mão, mas como vocês devem imaginar, só coleciono fracassos. Por falar em natural, esse natural aí de vocês é natural pra quem? Pra preto é que não é, né? É tipo band-aid, que não existe pra nós, que temos uma demão generosa de melanina. 

Cansei de levar uma dessas meias na doce ilusão de que, ao se misturar com a minha pele, ela teria o tom adequado, mas não. Elas são sempre muito mais claras e eu sempre fico com um quê de palhaço. Agora vocês têm uma tal de "natural claro" que, obviamente, não foi feita pra mim. Quando vocês lançarem a "natural escuro" ou coisa que valha, me avisem, ok? Estarei sentadinha na pracinha mais próxima, segurando uma rosa vermelha e vestindo uma meia-arrastão, que é pra não ter erro.

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Meio parda, meio indígena


Chega a ser comovente a tentativa desesperada de uns vendedores que falam de um tudo pra convencer alguém a comprar alguma coisa, né? Eu acabei de ouvir isso aqui, ó: "menina, ficou super em você! Combinou com a sua pele! Caiu superbem em você, que é meio parda, meio indígena". Gargalhei e ele, derrotado e extremamente franco, disse: "ah, sei lá, né? Não sabia o que dizer". Rimos. Não comprei.
Meio parda, meio indígena. Meio Jeremias, meio Papa Capim. Meio "As filhas do vento", meio "Tainá - uma aventura na Amazônia".



terça-feira, 18 de agosto de 2015

Direto para a escola


Dois garotinhos uniformizados e com mochilas azuis apareceram sozinhos, hoje cedo, na fila do BRT. Não deviam ter mais do que 9 anos. Logo ganharam a simpatia dos seguranças e dos passageiros, que riam das gracinhas que eles diziam com uma animação matinal que eu francamente invejo.

Eles eram fofos, mesmo. Eram engraçados e meio malandros no jeito de falar também. Ouviram de alguém da fila aquela piadoca que todo mundo ouviu pelo menos uma vez na vida: “é pra ir pra escola pra estudar, não só pra merendar, hein?”. Como toda criança que ouve isso, os dois sorriram sem terem achado graça alguma.

Eles tiveram prioridade no embarque, ninguém reclamou e logo pediram que o ar fosse ligado. Pedido feito, pedido atendido, ainda que não por causa deles. Os dois fizeram uma viagem curta; foram de Madureira até a Praça Seca. Nem 10 minutos. Quando levantaram para descer, uma passageira disse com a autoridade de uma mãe: “é pra ir direto pra escola, não é pra ficar de bobeira na rua, tá?”. Um deles ficou quieto, mas o outro respondeu: “a gente tá indo pra escola, tia! A gente tá atrasado.”. E a mulher completou: “ah, bom! Tem que estudar mesmo pra não ter de andar de BRT pro resto da vida”. Aaaah… Os meninos desceram e uma lágrima quase correu no canto do meu olho.

Agora veja você… Desde quando o BRT é uma exclusividade dos que não puderam estudar? Indignada, quase esfreguei o meu diploma e os meus boletins escolares na cara dela. Só não fiz isso porque não costumo andar com o meu diploma e os meus boletins escolares por aí. Mas foi por pouco.

domingo, 9 de agosto de 2015

Compra de mês


Todos os dias, Ana faz o mesmo percurso rumo à faculdade: sai cedinho de casa, passa pela banca de jornal, cumprimenta Seu Alfredo, o jornaleiro, caminha cerca de quinze minutos até o ponto de ônibus mais próximo e espera outros quinze até que o coletivo passe e a leve para a aula. Todos os dias são assim. Todos, exceto aquele dia. Exceto aquela quinta-feira.

Além de ter dormido mais do que a cama, levantado às pressas e engolido o café para ver se despertava de uma vez, Ana ainda perdeu o ônibus que acabou passando pelo ponto no exato minuto em que chegou, já sem fôlego, a ele. Não teve escolha. Ela teve de esperar mais alguns minutos pela condução seguinte.

O ônibus apareceu no horizonte, Ana fez sinal e, exausta, acomodou-se no único assento vazio que restava. Sentiu até um certo prazer de saber que, apesar de o dia ter começado mais corrido que o de costume, poderia aproveitar aquela meia hora de viagem tirando um cochilo.

No ponto seguinte, entraram seis passageiros: um casal, três adolescentes barulhentos e a Dona Emília, uma dona de casa de 70 e poucos anos que, naquela viagem, foi a colega de assento de Ana.

Um carro quase bateu na traseira do veículo, freou bruscamente, seguiu costurando o trânsito e todos os passageiros se assustaram. Ana resolveu, então, puxar papo com a sua colega de assento. Um papo tão relevante quanto aqueles típicos de elevador e de sala de espera de consultório médico, que a gente puxa por puxar, sem pensar muito nas consequências, e se arrepende no mesmo segundo.

Para ler a continuação do conto, clique aqui.

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Conhecido incógnito


É desesperador quando alguém te chama na rua, sorri pra você e você, embora saiba que aquele rosto lhe é familiar, não tem a mais vaga ideia de onde o conhece, né? Quando isso acontece comigo, recorro a algumas perguntas na esperança de que o conhecido incógnito diga o nome de alguém ou de algum lugar e eu, pá (!), mate a charada. Eis as perguntas:
Como vai o pessoal lá?
Tem visto o pessoal?
Nem lembro quando nos vimos pela última vez... quando mesmo?
Tem ido lá?
Tá morando onde?

Na última vez, eu escolhi esta última pergunta. A moça fez, por um segundo, uma cara de estranhamento e no segundo seguinte, eu lembrei de quem se tratava. Pena que não cabia fazer essa pergunta a ela... Eu me senti bem ridícula por não ter reconhecido a moça de cara e tô determinada a tomar, diariamente, doses cavalares de Cogumelo do Sol.