quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Trem da alegria


Acho vendedores ambulantes verdadeiros artistas. Sério mesmo. Eles dizem e fazem de um tudo pra valorizar o produto que estão vendendo. Tô eu aqui, hoje, depois de uma longa temporada, de volta ao trem da SuperVia e num horário de grande circulação de passageiros. Assim que o trem saiu da Central, um homem começou a sua maravilhosa apresentação:
"Pessoal, o caminhão virou e o moço trouxe aqui, pra vocês, a deliciosa bala com aroma de café. Essa bala é de rico. É, gente! O moço não mente, não. É bala de grã-fino. Vende no Copacabana Palace, no Aeroporto Santos Dumont e na Rodoviária Novo Rio. Basta experimentar umazinha pra ver que essa bala é a mais fina, a mais gostosa e a mais nobre bala que você já experimentou. Experimenta, vai! Compra aqui no moço. É bala de rico, é bala de bacana, só que a preço de banana!"
Vários passageiros compraram e, automaticamente, subiram de classe social.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Quintal vizinho


Não é exagero. Todo santo dia, um pequeno acidente acontece no quintal ao lado. Minha vizinha vive aos berros e para o meu espanto, nunca fica rouca. Moram com ela o marido, quatro filhas e um filho. As meninas são escandalosas como a mãe, dramáticas e choram por tudo. A caçula, que deve ter pouco mais de dois anos, tem um vocabulário surpreendente para uma criança dessa idade. Ela é esperta e dá várias voltas nas irmãs.
Sempre que alguma coisa quebra lá dentro, a mãe faz o favor de lamentar, em voz alta, o prejuízo da vez. Já rolou de tudo: "ai, a minha televisão!"; "eu não tô acreditando que vcs derrubaram a geladeira!"; "que barulho foi esse aí, garotas?!"; "a estante vai virar na cabeça de vcs!"; "Meu Deus do céu, vcs quebraram a janela! Não pisa nos caaacos!"; "olha aí o que você fez com a sua irmã!"; "bem feito! Eu avisei! Se botar o dedo no fogão de novo, vai levar outro choque".
A caçula é malandra. Ela está sempre envolvida nos acidentes da casa. Quando não é a autora do pequeno delito, é cúmplice. Muitas vezes é vítima. Ontem, por exemplo, ela estava chorando aquele choro que começa estridente, fica mudo por uns 10 segundos e volta mais estridente ainda. A mãe correu, o meu coração veio na boca e a irmã disse: "ela bateu a cabeça no chão." Uns minutos depois, a menina já estava ótima, correndo pra lá e pra cá, dando gargalhada, enchendo o saco do cachorro e cheia de disposição pra quebrar o que ainda resta na casa.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Aos prantos


Eu estava há meses tentando comprar um produto para o meu cabelo que estava em falta em todos os sites especializados. Ontem, finalmente, vi que um deles voltou a tê-lo no estoque. Fiquei feliz e, mais do que depressa, garanti logo o meu porque, né? Não sou boba. Agora há pouco, sei lá por que razão,voltei ao site de novo e descobri que, hoje, o produto está R$30 mais barato. Um golpe duríssimo pra uma pessoa pobre como eu. Por fora eu tô ótima. Ninguém diz que sofri esse baque. Mas por dentro... ah, por dentro eu tô aos prantos.

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Mãe de carteirinha

Esta semana, minha irmã está participando de um treinamento numa outra unidade da empresa onde trabalha. Ela tem saído de casa mais cedo que de costume. Para ajudá-la, tenho assumido provisoriamente a função de mãe da Milena nas primeiras horas do dia.
Hoje, assim que acordou, Milena foi para o banho, tomou seu café da manhã, se arrumou para a escola, se penteou e apareceu maquiadíssima na sala. Uma maquiagem equivocada tanto para a escola, quanto para um casamento, mas perfeita para um baile de Carnaval.
Ordenei que tirasse aquilo. Ela fez manha, tentou me convencer de que não tinha problema ir à aula daquele jeito, mas eu, firme e serena, disse: "tira isso agora". Ela insistiu mais um pouco, mas como eu estava irredutível, apelou: "todo mundo vai assim pra escola!". Aí eu, sem pena, mandei: "você não é todo mundo!". Fim da discussão.
"Você não é todo mundo" me eleva à categoria de "mãe", embora eu nunca tenha parido. Vou juntar a papelada e dar entrada na minha carteirinha hoje mesmo.


segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Os 80 anos de Dona Miúda

A Beth e a minha mãe trabalharam juntas durante muitos anos e são amigas há quase 40. Elas mantêm contato e se frequentam até hoje.
Beth é uma mulher de 61 anos, viúva, sem filhos e cheia de filhos. Explico: ela não gerou, mas criou e ainda ajuda a criar os dos irmãos (na verdade, dos primos, já que é filha única), sobrinhos e sobrinhos-netos. É daquelas mulheres fortes que conduzem a família com dedicação e amor bonitos de se ver. Acho que todo mundo conhece pelo menos uma.
As festas da família dela são sempre animadas e muito fartas. Minha mãe vai a praticamente todas. Meu pai, que não é bobo, vai também. Eu só tinha ido ao aniversário de 1 ano da Camile, uma de suas sobrinhas-netas. Lembro que fomos com a Milena – na época, um bebê de pouco mais de 1 ano, e que era uma máquina de fazer xixi.
Como sempre faz, a Beth ligou para a minha mãe e a convidou para ir à festa de 80 anos de sua tia. O convite foi feito por telefone e oficializado com um cartão que chegou via Correios poucos dias depois. Beth é a resistência. Ela não se entregou de vez à era digital e não está nem aí pra isso.
Eu só tinha ido ao aniversário da tal sobrinha-neta. Este ano, sei lá por que razão, resolvi ir de novo a uma comemoração da família dela. Mentira, sei, sim. Milena estava com o pai, Daniele tinha saído com o Alex e eu, que não tinha planejado sair com ninguém para canto nenhum, não estava a fim de ficar sozinha em casa. Então eu decidi: iria também à festa de Dona Nilceia, a Dona Miúda para os íntimos. E lá fomos nós, eu, meus pais, a Vera (outra amiga de trabalho) e a Kátia, irmã da Vera, rumo a Bangu que, ironicamente, estava bem fresquinho naquele sábado insuportável de tão abafado. Um mito caiu: o bairro mais quente do Rio teve uma noite bem agradável.
Fomos os primeiros a chegar. As mesas ainda estavam sendo montadas e Dona Miúda já estava lá, toda elegante com o seu vestido lilás aguardando ansiosa a chegada dos convidados. E como eles demoraram a aparecer… Dona Miúda, coitadinha, não conseguia disfarçar a tensão. Pouco depois, ela veio até a nossa mesa e disse: “vocês não vão ver o meu bolo, não? Ele está tão bonito…” Que mancada a nossa… Chegamos e não fomos ver a mesa cuidadosa preparada para celebrar o aniversário dela. Panos roxos e lilases no painel ornavam com o seu vestido. O bolo também era lilás e sobre ele, uma boneca pretinha com agulhas de tricô nas mãos dava o toque final. Dona Miúda deu uma gargalhada e falou: “Eu gosto de fazer tricô enquanto estou vendo televisão”.
Elogiei o vestido e ela disse: “gostou? Eu achei muito comprido”. Ele batia nas canelas, mas Dona Miúda, danadinha, queria mesmo que batesse na altura dos joelhos. Falou também que não gosta de vestidos e que o único que tem é aquele que estava usando. “Meu negócio é blusa e saia”, disse. Mais tarde, ela voltou à nossa mesa, quis saber se estávamos sendo bem servidos e nos contou que não sabe cozinhar para pouca gente. Pensei até que ela tinha preparado tudo o que tinha na festa, mas não. Dona Miúda não sabe fazer pouca comida no dia a dia. Depois eu entendi por quê.
Os outros convidados chegaram praticamente juntos. De uma hora para a outra, todas as mesinhas foram ocupadas. Vans e mais vans paravam na porta e deixavam familiares e amigos vindos de Santa Cruz. E as crianças? Nossa, elas pareciam brotar do chão. A Beth fez questão de apresentar um por um. Minha mãe disse que é sempre apresentada a toda família, mas, no ano seguinte, já não sabe mais quem é quem.
Conheci a Elaine, o Maycon, o Gustavo, a Camile (a da festa de 1 ano), o Renan (que tem 14 anos e 1,78m), o bebê Miguel (que amou puxar o meu cabelo), a Carla, o pai da Carla, os avós da Camile, a Fernanda… Só consegui guardar estes nomes. O pai da Carla e os avós da Camile foram apresentados assim mesmo. Não sei como eles se chamam.
Sabe gente feliz? Assim é a família da Dona Miúda. Enquanto as crianças se divertiam no pula-pula, os adultos conversavam, dançavam e riam em todos os espaços da casa de festas. Tinha tanta bebida, que cheguei a lamentar por não gostar de cerveja. De qualquer forma, os antibióticos que eu estava tomando me impediriam de pôr álcool na boca.
O DJ Miguel caprichou no repertório. Botou as velhinhas para dançar ao som de Anitta, Jovelina Pérola Negra, Léo Jaime, James Brown e outros artistas. Vi a Beth dançando e fiquei hipnotizada. A mesma dancinha servia para todos os ritmos. Sempre que a minha mãe vai nas festas organizadas por ela, eu lembro daquela música da Angélica que rima Bete com sete e basquete. De repente eu estava lá, na festa da Beth, vendo a Beth dançar. Emoção demais para o meu coração.
O que amigas de tantos anos fazem quando se encontram depois de muito tempo sem se ver? Relembram os velhos tempos, riem, falam da família, dos antigos colegas, quem morreu, quem ainda está vivo, quem pirou e, entre outras coisas, quem anda sumido. Minha mãe quis saber por onde anda a Marlene. Vera e Kátia disseram que ela mora ali, na Dom Hélder Câmera, e anda com uma ideia fixa: arrumar alguém, uma companhia. Pensei: ah, que legal! A Marlene não desistiu do amor”. Que nada! Vera disse que ela quer alguém para pagar a luz, a água… quer alguém para ajudar a pagar as contas porque sozinha não está dando.
Minha mãe não desiste do plano de me casar a qualquer custo. Jura que não tem essa intenção, mas sempre que tem uma oportunidade, dá um jeitinho de me empurrar para os filhos das amigas. Na festa, ela perguntou tantas vezes para a Vera como estava o filho dela, que eu até já sei: Rodrigo tem 37 anos, ficou um ano casado e não quer saber de filhos. Ela perguntava, ficava com um sorrisinho de canto de boca e me olhava de rabo de olho como se quisesse dizer: aproveita, boba!” Mudei de assunto em todas as vezes para que ela entendesse o meu recado e desistisse de me casar com o cara. Eu quase falei que pretendo ter 4 filhos e que não abro mão disso para acabar logo com aquele papo.
Sou muito fã da Beth. Ela é naturalmente engraçada e eu acho que não se dá conta disso. Disse que cata latinhas nas festas para levar para não sei quem, não sei onde e é criticada pelos sobrinhos, que dizem que isso é coisa de pobre. A resposta ela já tem na ponta da língua: “e eu sou rica, por acaso? Sou pobre mesmo! Eu, hein!” Amo a Beth. Depois, ela mandou a Carla distribuir as lembrancinhas das crianças e dos adultos. Para elas, um sacolinha com um Guaracamp, um copo bonitinho, balas, biscoitinhos e guloseimas de todos os tipos. Para nós, uma tulipa e uma toalha bordada.
A Beth me confidenciou baixinho que a pessoa que bordou as toalhinhas errou em metade delas. Comeu um ‘i’ e pôs um acento agudo que não existe no nome de batismo de Dona Miúda. Minha mãe ganhou a errada: Nilcéa. Eu tive sorte e ganhei a certa: Nilceia.
Infelizmente, não tirei uma foto com a aniversariante do meu celular. Só saí na que o Renan tirou quando ela foi de mesa em mesa. Quando meu pai pediu para posar ao seu lado, Dona Miúda, topou e depois disse: “deixa eu ver como ficou o retrato, meu filho”. Viu, aprovou e foi falar com outra pessoa.
Às 23 horas, a festa seguia animadíssima, mas como moramos longe e estávamos lá desde as 19, resolvemos voltar para casa. Ela lamentou, tentou nos comprar com docinhos, mas estávamos mesmo decididos a ir embora. Parabenizamos pela família linda e feliz, elogiamos a festa e ela se adiantou: nos convidou para o seu aniversário de 90 anos. Está certo, então. Convite feito, convite aceito. A gente se vê em 2024, Dona Miúda!

sábado, 8 de novembro de 2014

Aquele do vôlei


PAI: Outro dia, eu vi aquele jogador de vôlei de praia lá em Ipanema. É Emanuel e...?
EU: Ricardo.
PAI: Isso! Eu vi o Emanuel.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Minicalendário parado no tempo


Tenho um TOC. Na verdade, tenho alguns, mas vou falar de um, especificamente: tenho pavor daqueles calendários pequenininhos que recebemos de farmácias, de entregadores de gás, cooperativas de táxi e outros serviços de entrega em domicílio. Ok, o pavor não é deles, exatamente. É de gente que cola esses minicalendários na geladeira e nos outros móveis da cozinha, mas não arranca a folhinha quando o mês acaba. É ridículo? Eu sei que é. Mas alguns TOCs são assim mesmo, meio ridículos.
Se estou na casa de alguém e vejo esse absurdo, peço autorização para arrancar as folhinhas até chegar ao mês corrente. Se não tenho muita intimidade com o dono da casa, seguro a onda. Tudo tem limite.
Não posso chegar na casa de um amigo meu, encontrar, em pleno novembro de 2014, um minicalendário estacionado em janeiro de 2012 e não fazer nada. Já passei por isso (de encontrar um ímã parado num mês de outro ano), fiquei bem indignada com aquela distração da pessoa e tratei de corrigir. Fiz um bem e fiquei aliviada.